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‘Atração Fatal’ (1987) não é apenas o suspense mais famoso dos anos 80, ele é também o mais prestigiado daquela década. A prova disso são as seis indicações ao Oscar que recebeu, incluindo a principal e tão almejada de melhor filme do ano. E isso em uma época em que apenas cinco filmes eram presenteados com tal honraria. Além disso, ‘Atração Fatal’ recebeu nomeações de melhor diretor (Adrian Lyne), roteiro adaptado (já que tem como base um curta do mesmo James Dearden – que esticou a história para um longa) e atrizes principal e coadjuvante: as mulheres da trama, Glenn Close e Anne Archer, respectivamente.
‘Atração Fatal’ está atualmente disponível no catálogo da Netflix, e você precisa assistir de forma urgente. Para os mais novos, pode ficar a sensação de que já se viu essa história em diversos outros filmes. E com certeza você já viu. Porém, é preciso estar ciente também que todos os filmes atuais se inspiram em ‘Atração Fatal’. Além de tudo, este é um dos filmes mais influentes dos últimos 38 anos. O filme não foi o primeiro a apresentar uma história sobre um caso extraconjugal que sai completamente dos trilhos, mas foi o primeiro a escancarar de forma nua e crua, e a elevar essa narrativa a outro patamar.
Na trama, o astro Michael Douglas é Dan Gallagher, um homem de meia idade, feliz no casamento com Beth (Anne Archer). Ambos são pais da pequena Ellen (Ellen Latzen). Bem-sucedido, ele trabalha como advogado em Nova York. Porém, assim como Tom Ewell no clássico ‘O Pecado Mora ao Lado’ (1955), o sujeito ganha um vislumbre de liberdade matrimonial quando sua mulher e filha viajam para fora da cidade. No clássico filme de Marilyn Monroe, era a vizinha de cima quem começava a tentar o “solteiro de verão”, sem que ele realmente tivesse planos para o adultério.
Já em ‘Atração Fatal’, por serem estes os incorretos anos 80, não existe freio quando o protagonista conhece em um coquetel a sedutora Alex Forrest (Glenn Close). Mas o que era para ser um caso de uma noite só, se torna a extrema vingança feminina para os maridos infiéis. Alex não é a mulher descolada, moderninha ou compreensiva, apenas aparenta. Em partes podemos analisar a personagem como uma analogia de um problema que muitos maridos trazem para dentro de casa. Inclusive DSTs, como a Aids. Estudos no passado comprovaram que muitas mulheres adquiriam tais doenças, mesmo sendo casadas e fiéis. Eram eles, os maridos, que pulavam a cerca e traziam estas doenças para casa. O problema sem dúvida explode na cara do protagonista deste filme, quando a mulher simplesmente não aceita o “término” de sua relação relâmpago.
“Eu não serei ignorada”. Esta é uma das frases mais marcantes do longa, quando Alex se sente usada e jogada fora. É claro que existe toda uma questão de saúde mental da antagonista que jamais deve ser ignorada. Alex é a vilã aqui, e inclusive entrou em diversas listas dos melhores vilões da história do cinema. Ela é também uma mulher desequilibrada e psicologicamente abalada. Glenn Close chegou a levar o roteiro para dois psiquiatras, para que eles pudessem analisar a personagem e lhe informar como ela deveria ser abordada.
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Hoje, casos assim, de pessoas obsessivas, aparecem toda hora nos telejornais e são classificadas como stalkers, que virou até crime por aqui no Brasil também. Ou seja, pessoas que fantasiam um relacionamento inexistente, ou que até tiveram algum envolvimento real, mas que são incapazes de deixar o outro em paz. Estas pessoas aumentam significativamente a importância de uma relação, perseguindo e importunando o outro, e o impedindo de seguir em frente com sua vida também. Hoje, temos andando por aí diversas Alex, inclusive no Brasil, o que torna o filme ainda mais atual, por não se tratar mais de um comportamento raro, infelizmente. Um exemplo disso é a premiada minissérie ‘Bebê Rena‘, baseada em uma história real.
Quando o projeto de ‘Atração Fatal‘ estava sendo desenvolvido, algo em torno de 20 diretores passaram por ele e o abandonaram. Incluindo gente tarimbada como Brian De Palma e John Carpenter. Muitos desistiram por o acharem muito similar ao clássico ‘Perversa Paixão’ (1971), primeiro filme dirigido pelo lendário Clint Eastwood, que também protagoniza. Em ambos os filmes, o protagonista tem um envolvimento breve com uma mulher, que simplesmente não aceita o término e começa a assedia-lo, até que a coisa acabe em tragédia. E aqui voltamos ao tópico do início. Apesar de ‘Perversa Paixão’ ter vindo antes, é ‘Atração Fatal’ o filme que resiste ao teste do tempo, sendo famoso até hoje.
Ajuda para a fama de ‘Atração Fatal’ o prestígio do Oscar, mencionado anteriormente, e também o fato de que este foi o filme de maior bilheteria pelo mundo no ano de 1987. Foi uma verdadeira febre. Nos EUA, foi o segundo maior, atrás somente da comédia ‘Três Solteirões e um Bebê’. E não era comum nem naquela época vermos um thriller adulto triunfar sobre blockbusters recomendados para todos os públicos. Basta lembrar que em anos anteriores tivemos os sucessos absolutos de longas como ‘O Retorno de Jedi‘, ‘De Volta para o Futuro‘, ‘Os Caça-Fantasmas‘, ‘Indiana Jones‘ e ‘E.T. – O Extraterrestre‘.
Finalmente, o diretor Adrian Lyne foi contratado para o trabalho de dar forma ao filme. Lyne era um dos grandes nomes de Hollywood na época, e tinha no currículo sucessos como ‘Flashdance’ e ‘9 ½ Semanas de Amor’. Depois, Lyne viria a dirigir outro sucesso nos anos 90, ‘Proposta Indecente’. Para o papel do protagonista masculino, depois de meia Hollywood ser considerada, Michael Douglas embarcou no projeto, e foi um dos maiores defensores para que o filme saísse do papel. Douglas ficaria marcado na época por papeis sexualmente carregados como ‘Instinto Selvagem’ e ‘Assédio Sexual’.
Já para o papel protagonista feminino, diversas outras atrizes foram consideradas ou fizeram teste. Uma certeza é que muitos dos envolvidos na produção não queriam Glenn Close como Alex. Principalmente porque até aquele momento, a atriz era conhecida por personagens agradáveis e corretas, então ninguém conseguia vê-la como uma mulher problemática e psicótica. Aliás, Close no fim das contas se tornou a quarta escolha para o papel. As três primeiras eram Judy Davis, Barbara Hershey e Debra Winger. Todas passaram a oportunidade.
A vida é cheia de reviravoltas. Sendo assim, a quarta escolha terminou ficando com o papel. E não apenas isso, mas Alex Forrest se tornou a personagem mais icônica da carreira de Glenn Close, e uma pela qual ela ainda é lembrada até hoje. Close, aliás, diz que até hoje pessoas a param na rua e a agradecem por ter salvado seus casamentos. Acontece que assim como ‘Top Gun’ (1986) causou um alistamento em massa na marinha americana e ‘Tubarão’ (1975) tirou as pessoas da praia e as levou aos cinemas, ‘Atração Fatal’ fez os maridos do mundo todo guardarem seus passarinhos na gaiola e pensarem duas vezes antes de concretizar a traição.
Aliás, nos primeiros tratamentos do roteiro, ‘Atração Fatal’ possuía um teor muito mais semelhante a um filme de terror convencional. Porém, a entrada de talentos cada vez maiores começou a dar outra forma ao longa, uma certa classe. E embora o filme ainda tenha inúmeros momentos tensos e assustadores, ele recebeu tintas muito mais críveis e psicológicas.
Aqui, lidamos com dois protagonistas extremamente falhos. Por baixo da fachada de uma vida perfeita, o protagonista Dan não hesita em trair sua esposa. Como se esse fosse um comportamento esperado dele. E realmente era, dentro de uma sociedade machista da década de 1980, que se perpetuou pelas décadas seguintes. Hoje, com o surgimento do “novo homem” na sociedade, e da “nova mulher” também, comportamentos assim, embora ainda existentes, são menos tolerados. Mas ninguém está livre de cair na tentação do adultério.
Por outro lado, Alex hoje é diagnosticada com sua condição obsessiva pelo que ficou conhecido como a Síndrome de Clérambault ou Erotomania. Esta síndrome diz respeito a pessoas que acreditam piamente que o outro indivíduo está apaixonado por ela. Gerando uma convicção delirante. Ou seja, Alex é uma pessoa claramente doente. Isso fica óbvio em suas atitudes, que vão muito além de expor o comportamento adúltero de seu amante para a esposa. Aliás, a cena em que o próprio marido explica a situação para a esposa é uma das melhores do filme e ocasiona na separação do casal após a decepção da mulher e na quebra de confiança.
Os atos de Alex entraram no imaginário popular, pois são regados a requintes de crueldade. Em especial no que diz respeito ao coelhinho de estimação e seu destino – até hoje comentado. A mulher chega ao cúmulo de sequestrar momentaneamente a pequena filha do casal, e invadir a casa, visando cometer o assassinato da esposa no desfecho apoteótico. Nada disso pode ser jamais justificado, ainda mais por uma traição. É um castigo muito acima do crime.
Porém, no desfecho original do longa, ambos seriam punidos: o marido infiel e a mulher desequilibrada. O final gravado continha Alex cometendo suicídio com uma faca. As impressões digitais de Dan estariam na arma. Assim, o sujeito seria preso, acusado de tê-la matado, mesmo sem ter culpa. Um desfecho bem para baixo e que seria finalmente gravado anos depois em ‘Seven’ (1995), de David Fincher, um filme corajoso no qual o protagonista vai preso por assassinato no final.
Mas em ‘Atração Fatal’, as exibições teste com o final desesperançoso não agradou muito na época o público, e precisou ser regravado. Glenn Close foi a que mais se pronunciou contra o novo final, chegando ao cúmulo de se recusar a gravar outro desfecho. Ela seria eventualmente convencida de recriar o fim. O final que todos conhecem traz Alex como a única punida por essa história toda, e a família se une novamente na dor e no desespero. Ou será?