quarta-feira , 26 março , 2025

Artigo | A representatividade feminina em Hollywood: o Código Hays e a censura


Entre os anos de 1930 e 1968, vigorou em Hollywood uma espécie de tabuleta de regras a serem seguidas que censuravam diversas incursões narrativas e imagéticas com o objetivo de restaurar a imagem pública do maior antro artístico do planeta. Tais regras ficaram conhecidas como o Código Hays.

O nome dado às restrições em questão veio como uma espécie de homenagem a Will H. Hays, advogado e político presbiteriano e presidente da Associação de Produtores e Distribuidores de Filmes da América, entre 1922 e 1945, e que listava uma série de proibições a longas-metragens – como nudez, desrespeito à religião e à fé, referências à homossexualidade, referências positivas a atos criminosos e vários outros.



O Código em questão, após o final dos anos 1960, foi obliterado em meio a protestos e a inúmeras questões levantadas, sendo substituído pelo sistema de classificação como o conhecemos hoje. Todavia, foram essas regras que começaram a levantar questionamentos sobre a representatividade da mulher em Hollywood e de que forma personagens femininas estavam submetidas a um controle total de como seriam retratadas.

Porém, antes de partirmos para a análise desse Código, é sempre bom entender o que acontecia antes.

A ERA PRÉ-CÓDIGO

imagem 2025 03 25 125101541


No curto período de tempo entre 1927 e 1934, os filmes hollywoodianos retrataram a vida americana como nunca visto pensado. As mulheres podiam ser indivíduos completos, não apenas virgens divinizadas ou vamps destruidoras; a ação podia ser ambígua, ou seja, não havia padronizações do “bom” e do “ruim”, mas sim um arco de complexidade que permeava ambos extremos. Problemas políticos e sociais eram discutidos; o sexo, a sedução e a luxúria não eram mais considerados tabus 

No meio da pior crise econômica mundial, com mais de 30% da população estadunidense desempregada, as grandes salas de cinema ainda atraíam milhões de espectadores, os quais ficavam fascinados com as imagens das grandes estrelas de Hollywood – como Greta Garbo, Mae West, Norma Shearer, Barbara Stanwyck e Gloria Swanson. Essas atrizes eram reconhecidas pelo seu talento e idolatradas pela sua beleza; sua imagem era sinônimo de glamour, e Hollywood se encarregava do resto para construir, sobre cada uma dessa mulheres, um mito.  

Entretanto, em julho de 1934, o Motion Picture Production Code (Código de Produção Cinematográfica) foi outorgado, levando um dos períodos mais interessantes da história do cinema ao fim. A moral cristã prevaleceu sobre o liberalismo em Hollywood e logo os espectadores esqueceram da era de ouro e das histórias outrora retratadas, e os críticos relevaram a instauração do código supracitado. 

Assista também: 
YouTube video



imagem 2025 03 25 130109148

A década de 1920 configurou-se como a era do cinema mudo e do surgimento dos grandes estúdios e primeiros grandes astros: Charlie Chaplin, Mary Pickford, Lilianh Gish, Rudolph Valentino e Douglas Fairbanks. Já nessa época as atrizes eram classificadas em duas categorias: a ingênua ou a vamp. Poucas atrizes conseguiam quebrar o molde pré-estabelecido, já que os produtores não aceitavam outra representação da figura feminina. 

Mary Pickford, assim como outras atrizes da época, integrou-se como parte da categoria “ingênua”. Ela era jovem, bonita e branca e, assim, continuou a interpretar pobres e indefesas adolescentes até os trinta anos de idade em filmes como ‘Pollyana’ (1920) e ‘Little Lord Fauntleroy’ (1921). Porém, essas personagens femininas idealizadas, por assim dizer, não refletiam as mudanças sociais e culturais da sociedade estadunidense da época. 

Os “loucos anos 20” trouxeram uma nova sensação de liberdade para o jovem americano de classe média que estava inserido dentro dos grandes centros urbanos. A expansão do consumo permitiu o desenvolvimento de novas tecnologias, que tinham o objetivo de facilitar todos os aspectos da vida social. A primeira metade do século XX também foi marcada pela “Primeira Onda Feminista” com a conquista do direito do voto em 1919. 

imagem 2025 03 25 130042066

A geração “flapper” – termo usado na época para descrever as mulheres modernas – que surgiu com o final da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) – também marcou o fim da Era Vitoriana e dos ideais religiosos que permeavam a vida social e política. Porém, as únicas mulheres que mostravam autonomia sexual – e social – na tela do cinema eram as personagens denominadas vamps – caracterizadas como predadoras sexuais que seduziam homens e que deixavam um caminho de destruição moral. E devido à sua “habilidade”, o arco narrativo terminava com sua própria morte ou punição severa.  

Esse cenário começou a mudar a partir de 1926, quando uma das atrizes mais populares em Hollywood, Greta Garbo, foi colocada em suspensão por se recusar a interpretar uma vamp – cujo papel já havia feito em filmes como ‘Flesh and the Devil’ (1926) e ‘The Torrent’ (1926). Oito meses depois, o estúdio MGM cedeu às demandas da atriz e, a partir desse momento, nasceu um novo tipo de personagem: a mulher sexualmente livre, complexa, emotiva e real 

Em seis de outubro de 1927, o primeiro filme sonoro é lançado: ‘O Cantor de Jazz’ (1927) – e a primeira frase falada do cinema, na voz de Al Jolson -, “You ain’t heard nothing yet” (Vocês ainda não escutaram nada) -, se tornou um ícone e um presságio para a nova fase e o consequente futuro do cinema americano. E foi no cinema falado que a mulher encontrou sua voz. 

imagem 2025 03 25 130013077

Porém, em outubro de 1929, o entusiasmo econômico e social deu lugar a uma das piores crises econômicas da história, com a quebra da bolsa de valores de Nova York. Nessa mesma época, mais de um terço dos cinemas americanos fecharam as portas; o público semanal passou de um milhão para 60 mil espectadores – e nem a maior indústria americana saiu ilesa do que ficou conhecido como A Grande Depressão. 

Com o começo do cinema falado, cujos filmes eram conhecidos na época como “talkies”, os estúdios tiveram total liberdade de criação, assumindo riscos que custariam anos mais tarde sua censura, com a criação do Código Hays.  Em filmes como ‘Anna Christie’ (1930), o primeiro longa falado de Garbo, encontramos a atriz, conhecida pelos papéis glamorosos de vamps, interpretando uma imigrante recém-chegada em Nova York, depois de trabalhar em um bordel por dois anos. A primeira fala de Garbo releva o tom do filme – levando em consideração que a Lei Seca ainda estava em vigor no Estado americano: “Give me a whiskey. Ginger ale on the side. And don’t be stingy, baby” (me dê um whiskey, acompanhado de um ginger ale. E não seja mesquinho, querido).

‘Anna Christie’ foi um sucesso de crítica e público, tornando Garbo uma estrela do cinema falado e garantindo-a, além disso, uma nomeação para o Oscar de melhor atriz em 1931. 

imagem 2025 03 25 125940359

No mesmo ano, a MGM também lançou o filme que rendeu o Oscar de melhor atriz para Norma Shearer‘A Divorciada’ (1930). Conhecida pelos papeis idealizados no cinema mudo, Shearer deu voz a personagens que desafiavam o status quo, e o mais importante, que não eram punidas ou julgadas por isso. 

Em ‘A Divorciada’, Shearer interpreta uma mulher cujo marido mantém relações fora do casamento. Caso dentro dos padrões cinematográficos de alguns anos antes, a personagem sofreria calada e, no final, o marido, em um ato nobre, voltaria para os braços de sua verdadeira amada. Porém, no longa em questão, Jerry (Shearer) responde à traição do marido com a mesma moeda. Nesse momento, a indústria cinematográfica percebe que o sexo, mesmo em uma situação de crise financeira, ainda era lucrativo. E pela primeira vez, as heroínas da silverscreen refletiam o espírito da jovem americana que rejeitava os tabus da Era Vitoriana e estava disposta a explorar o seu poder sexual. Apesar da preocupação do estúdio, o filme foi um sucesso, estabelecendo o domínio feminino entre os atores mais bem pagos de Hollywood. 

Shearer e Garbo não estavam sozinhas. Barbara Stanwyck, em ‘Serpente de Luxo’ (1933), também trouxe um novo retrato da juventude americana, que buscava independência, ao mesmo tempo que enfrentava as dificuldades da crise econômica. 

imagem 2025 03 25 125847818

O filme, analisado pelo grupo, conta a história de Lily, uma jovem que vive explorada pelo pai, dono de um speakeasy – bares onde as bebidas eram vendidas ilegalmente durante a Lei Seca – e que cuja morte a faz tentar a sorte em Nova York. Baseado na filosofia de Nietzsche, a personagem reprime os seus sentimentos para focar apenas no seu objetivo principal – tornar-se rica. Dessa forma, ela usa os homens, assim como os eles a tinham “usado” durante toda sua vida. É importante ressaltar que o simples fato de usar um filosofo como um traço marcante de Lily demonstra uma construção profunda da personagem, recurso que é negligenciado por consequência do Código.  

O filme está carregado de críticas sociais, revelando de forma bruta a situação do operário americano, que se via desamparado pelo governo durante os primeiros anos da crise. Nessa linha, o filme coloca em discussão a corrupção e o caos social gerado pela pobreza – tópicos que anos mais tarde seriam considerados subversivos. 

Nas primeiras cenas do longa, vemos o pai de Lily negociando com um político que protege o seu estabelecimento ilegal em troca de favores. O público é levado a concluir, pelo quadro seguinte, a verdadeira intenção do homem. Lily é deixada sozinha com o político corrupto e recusa os seus avanços, até que ele se torna violento e, como ponto de virada, ela o ataca com uma garrafa de vidro. A cena se encerra com o homem saindo do bar, ensanguentado. Agora, a mulher não só tinha liberdade e desejos sexuais, mas também o direito de escolher, como bem entender, seu parceiro ou sua parceira.

imagem 2025 03 25 125808708

Lily usa da suposta “fraqueza” masculina para ascender profissionalmente, sem nenhuma vergonha de explorar a sua sexualidade para alcançar os seus objetivos pessoais. Essa também era uma característica muito explorada durante esse período do cinema americano, além de outros aspectos de natureza dúbia, principalmente em relação ao caráter das personagens – resultando, assim, em criações tridimensionais. 

Ainda em 1929, Shearer causou um choque na estreia do filme ‘The Trial of Mary Dugan’. Aqui, a atriz interpreta uma dançarina da Broadway, cortejada por vários homens, acusada de homicídio. Mesmo assim, o filme espera que o público se identifique com a personagem, usando de recursos básicos da narrativa para que todos possam torcer pela vida de Mary (Shearer). Assim como outros filmes dessa era, ‘The Trial of Mary Dugan’ ousou desafiar a cultura americana, principalmente em relação ao papel social dos gêneros. Ao invés de refletir a moral pregada pela sociedade, esses filmes incitavam o público a repensar os valores sociais e políticos – e a moral pré-direcionada do que era considerado “bom” ou “ruim”. 

Segundo o livro Complicated Women: Sex and Power in Pre-Code Hollywood (2001), antes do Código, as mulheres tinham amantes, filhos antes do casamento, abandonavam os maridos infiéis, exploravam sua sexualidade e mantinham posições profissionais sem se desculparem pela sua independência, ou seja, agiam de um jeito que, segundo o imaginário coletivo de atualmente, só seria possível depois dos anos de 1960. 

A ERA DO CÓDIGO

imagem 2025 03 25 125742420

O cinema foi concebido, inicialmente, como um lugar escuro, onde a espionagem para com o outro era permitida e a pulsão do olhar encontrava um terreno propicio para manifestação. O “pecado” do voyeurismo está na base do próprio dispositivo técnico do cinema – máquinas, o “ver” através dos buracos da fechadura, ou seja, lugares onde se pode ver sem ser visto. Dessa forma, até hoje, o prazer do filme não pode ser dissociado do olhar como objeto de desejo.  

Os filmes que antecederem o Código tendiam a explorar justamente o prazer do olhar e usavam o corpo feminino como a forma mais óbvia e apelativa em uma sociedade ocidental em crise, regrada, de certa forma, pela ideologia cristã e pelas regras do patriarcado. A objetificação da mulher é, também, uma consequência de uma indústria formada em sua grande maioria por homens, em todos os níveis de produção e direção. Ou seja, os valores e atitudes reafirmados nos produtos da indústria cultual são dessa classe dominante, dona dos meios de comunicação. 

Em filmes como ‘Cavadoras de Ouro’ (1933), um musical pré-código dirigido por Mervyn LeRoy e pelo renomado coreógrafo Busby Berkeley, a mulher, apesar de assumir o papel de protagonista no longa, ainda é colocada, muitas vezes, literalmente, como um objeto de cena. Como na primeira sequência do musical, onde todas as mulheres enquadradas nos primeiros minutos aparecem vestidas como moedas, por vezes a fantasia esconde o rosto das dançarinas, que cantam a música “We’re in the Money”. A perda da individualidade e humanidade das showgirls recai, também, sobre a falta de diversidade entre as dançarinas, pois todas as mulheres em cena são fisicamente similares, ao mesmo tempo em que sua identidade está sendo consumida pela grandiosidade do cenário e do espetáculo.

imagem 2025 03 25 125721093

Segundo o linguista e filósofo Ferdinand de Saussere, o processo de criação de sentido não é neutro. Dessa forma, se levarmos o contexto econômico em consideração, o corpo feminino é relacionado diretamente ao “objeto” de desejo mais relevante durante os anos da recessão americana, o dinheiro. O próprio diretor, conhecido por projetar as mais belas coreografias do cinema, descrevia “suas garotas” (as dançarinas) como “perolas idênticas em um fio de nylon”.  A mulher, passiva e objetificada, funciona como um objeto de fetiche, enquanto o homem assume o seu papel de voyeur.   

Moralistas cristãos, especialmente católicos, sempre tiveram uma posição muito clara em relação a “indecência” em Hollywood. Em 1922, os estúdios se uniram para criar o MPPDA (Motion Picture Producers and Distributors of America) e indicar Hays para ser o presidente dessa organização, com o objetivo de limpar a indústria cinematográfica de todos os males. 

Com a popularização do cinema americano, Hollywood, se tornou a terra do pecado e do sucesso, atraindo artistas, investidores e, principalmente, escândalos. Preocupados com possíveis intervenções do Estado, os estúdios se uniram, novamente, em 1930, para criar o Motion Picture Production Code. O objetivo inicial, desse código, era evitar a censura, criando um guia para auxiliar os estúdios durante a produção audiovisual. 

imagem 2025 03 25 125657616

Porém, em 1934, Joseph Breen, um católico fervoroso, assumiu a presidência do MPPDA, e, no dia 1° de julho de 1934, instituiu o Código Hays. A partir de então, as peças audiovisuais só poderiam ser exibidas nas telas de cinemas americanas, ou até mesmo entrar em produção, depois de receberem o selo de aprovação do Código.  

O Motion Picture Production Code durou mais de 34 anos, até 1968, construindo, dessa forma, no imaginário coletivo, uma américa idealizada, a terra da liberdade, com príncipes de terno e gravata e princesas virginais. Esses filmes calcaram, durante anos, barreiras de gênero e raça, que ainda são visíveis na produção cinematográfica atual, e fizeram parte do consumo cultural, que formou os inúmeros profissionais, que hoje, atuam em importantes cargos da indústria do cinema em todo o mundo.

Sob as limitações do Código, a sétima arte entrava em um novo período. Os filmes não só estavam proibidos de exibir nudez ou qualquer linguagem obscena, a partir de agora, os estúdios deveriam seguir uma extensa lista de do’s and don’ts/be careful (faça e não faça/tenha cuidado). Dessa forma, mais uma vez, a mulher seria submetida a posições secundarias; o sexo antes do casamento, o adultério e o divórcio estão proibidos – e caso a personagem cometa qualquer um desses “pecados”, mesmo em nome do enredo, ela deve sofrer as consequências do seu ato.

NÃO FAÇA 

TENHA CUIDADO 

Escravidão branca  Violências, roubos e furtos 
Miscigenação (relações afetivas ou sexuais entre negros e brancos)  Simpatia com criminosos 
Nudez  Pessoas e instituições públicas 
Ofender, ridicularizar ou profanar crenças religiosas (mais especificamente as católicas, cristãs e protestantes)  Homem e mulher deitados na mesma cama e cenas de beijos excessivos 
Gestos e posturas vulgares  Estupro 
Tornar vícios atraentes (jogos de azar, bebidas alcoólicas e drogas ilícitas)  Crueldade com crianças e animais 
Referências a perversões sexuais e doenças sexualmente transmissíveis  Sedução deliberada 

 

Essa lista, apesar de diminuir o papel da mulher como objeto sexual, diminuía sua representação em geral, tornando-as, em todos os filmes, personagens rasas resumidas a “boas” ou “más”. 

Antes da instalação das regras, as mulheres podiam enganar os homens, os fazer de bobos, roubar, matar, trair e isso não significava que estas iriam se dar mal no fim, o que contrasta com os filmes feitos durante o código, onde as personagens “impuras” deveriam morrer, serem presas, ou algo do gênero. 

Os atores e principalmente as atrizes que alcançaram o sucesso durante os anos pré-Código, interpretando personagens complexos e misteriosos, de repente estavam enfrentando dificuldades com péssimos roteiros e com personagens fracos. Algumas estrelas de Hollywood conseguiram sobreviver a transição: Shearer e Stanwyck, por exemplo, mantiveram sua popularidade. Porém, algumas lendas do cinema americano, como Garbo, Marlene Dietrich e Mae West, começaram a perder público poucos anos após a aprovação do Código. Indefesa e frágil, a mulher do cinema, já não representava a mulher atuante na sociedade, que enfrentou os anos difíceis da Depressão e estavam prestes a encarrar a Segunda Guerra Mundial. 

imagem 2025 03 25 125613069

Mick LaSalle escreveu em ‘Complicated Women’ que o Código “[…] foi designado para colocar o gênio de volta na garrafa – e a mulher de volta na cozinha”. O papel da mulher, mais uma vez, estará restrito aos moldes do cinema mudo – a ingênua ou a vamp (que agora será chamada de femme fatale, reforçando o seu papel de vilã) voltam as telas de cinema do mundo todo. 

Em 1939, Dietrich, famosa pelos seus grandes papeis durante o cinema pré-Código, volta as telas depois de dois anos sem atuar, com o aclamado western, ‘Destry Rides Again’ (1939). O filme conta a história do jovem xerife Destry Jr. (James Stewart), que chega na pequena cidade de Bottleneck para acabar com o crime organizado. Dietrich interpreta Frenchy, uma cantora e dançarina do bar local, namorada e cúmplice do chefe da organização criminosa.  

imagem 2025 03 25 125624396

Frenchy, a nova femme fatale do cinema americano, é uma personagem provocativa – suas roupas são curtas e a maquiagem é carregada – uma perfeita atriz de cabaré, a personagem canta músicas provocativas e recebe atenção de todos os homens da cidade. Porém, qualquer semelhança com as mulheres independes do cinema que antecedeu o Código, acaba por aqui. Frenchy se apaixona por Destry, que não se entrega ao “pecado da carne” e, no final da trama, a dançarina morre em seus braços depois da batalha final entre o bem e o mal – com a vitória do jovem xerife, que se torna o herói da cidade. 

A cena final do filme ilustra o significado do Código para o papel feminino. Frenchy, para os padrões do Código Hays, é uma mulher “má”, pois a personagem não é casada, mantém um relacionamento com um bandido e vive em um ambiente hostil. De acordo com a censura, sua única saída é sofrer “a punição”, que nesse caso vem com a sua morte, no último ato do longa.


Assista:
YouTube video

Mais notícias...

Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

Siga-nos!

2,000,000FãsCurtir
372,000SeguidoresSeguir
1,620,000SeguidoresSeguir
200,000SeguidoresSeguir
162,000InscritosInscrever

ÚLTIMAS NOTÍCIAS

MATÉRIAS

CRÍTICAS

Artigo | A representatividade feminina em Hollywood: o Código Hays e a censura

Entre os anos de 1930 e 1968, vigorou em Hollywood uma espécie de tabuleta de regras a serem seguidas que censuravam diversas incursões narrativas e imagéticas com o objetivo de restaurar a imagem pública do maior antro artístico do planeta. Tais regras ficaram conhecidas como o Código Hays.

O nome dado às restrições em questão veio como uma espécie de homenagem a Will H. Hays, advogado e político presbiteriano e presidente da Associação de Produtores e Distribuidores de Filmes da América, entre 1922 e 1945, e que listava uma série de proibições a longas-metragens – como nudez, desrespeito à religião e à fé, referências à homossexualidade, referências positivas a atos criminosos e vários outros.

O Código em questão, após o final dos anos 1960, foi obliterado em meio a protestos e a inúmeras questões levantadas, sendo substituído pelo sistema de classificação como o conhecemos hoje. Todavia, foram essas regras que começaram a levantar questionamentos sobre a representatividade da mulher em Hollywood e de que forma personagens femininas estavam submetidas a um controle total de como seriam retratadas.

Porém, antes de partirmos para a análise desse Código, é sempre bom entender o que acontecia antes.

A ERA PRÉ-CÓDIGO

imagem 2025 03 25 125101541

No curto período de tempo entre 1927 e 1934, os filmes hollywoodianos retrataram a vida americana como nunca visto pensado. As mulheres podiam ser indivíduos completos, não apenas virgens divinizadas ou vamps destruidoras; a ação podia ser ambígua, ou seja, não havia padronizações do “bom” e do “ruim”, mas sim um arco de complexidade que permeava ambos extremos. Problemas políticos e sociais eram discutidos; o sexo, a sedução e a luxúria não eram mais considerados tabus 

No meio da pior crise econômica mundial, com mais de 30% da população estadunidense desempregada, as grandes salas de cinema ainda atraíam milhões de espectadores, os quais ficavam fascinados com as imagens das grandes estrelas de Hollywood – como Greta Garbo, Mae West, Norma Shearer, Barbara Stanwyck e Gloria Swanson. Essas atrizes eram reconhecidas pelo seu talento e idolatradas pela sua beleza; sua imagem era sinônimo de glamour, e Hollywood se encarregava do resto para construir, sobre cada uma dessa mulheres, um mito.  

Entretanto, em julho de 1934, o Motion Picture Production Code (Código de Produção Cinematográfica) foi outorgado, levando um dos períodos mais interessantes da história do cinema ao fim. A moral cristã prevaleceu sobre o liberalismo em Hollywood e logo os espectadores esqueceram da era de ouro e das histórias outrora retratadas, e os críticos relevaram a instauração do código supracitado. 

imagem 2025 03 25 130109148

A década de 1920 configurou-se como a era do cinema mudo e do surgimento dos grandes estúdios e primeiros grandes astros: Charlie Chaplin, Mary Pickford, Lilianh Gish, Rudolph Valentino e Douglas Fairbanks. Já nessa época as atrizes eram classificadas em duas categorias: a ingênua ou a vamp. Poucas atrizes conseguiam quebrar o molde pré-estabelecido, já que os produtores não aceitavam outra representação da figura feminina. 

Mary Pickford, assim como outras atrizes da época, integrou-se como parte da categoria “ingênua”. Ela era jovem, bonita e branca e, assim, continuou a interpretar pobres e indefesas adolescentes até os trinta anos de idade em filmes como ‘Pollyana’ (1920) e ‘Little Lord Fauntleroy’ (1921). Porém, essas personagens femininas idealizadas, por assim dizer, não refletiam as mudanças sociais e culturais da sociedade estadunidense da época. 

Os “loucos anos 20” trouxeram uma nova sensação de liberdade para o jovem americano de classe média que estava inserido dentro dos grandes centros urbanos. A expansão do consumo permitiu o desenvolvimento de novas tecnologias, que tinham o objetivo de facilitar todos os aspectos da vida social. A primeira metade do século XX também foi marcada pela “Primeira Onda Feminista” com a conquista do direito do voto em 1919. 

imagem 2025 03 25 130042066

A geração “flapper” – termo usado na época para descrever as mulheres modernas – que surgiu com o final da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) – também marcou o fim da Era Vitoriana e dos ideais religiosos que permeavam a vida social e política. Porém, as únicas mulheres que mostravam autonomia sexual – e social – na tela do cinema eram as personagens denominadas vamps – caracterizadas como predadoras sexuais que seduziam homens e que deixavam um caminho de destruição moral. E devido à sua “habilidade”, o arco narrativo terminava com sua própria morte ou punição severa.  

Esse cenário começou a mudar a partir de 1926, quando uma das atrizes mais populares em Hollywood, Greta Garbo, foi colocada em suspensão por se recusar a interpretar uma vamp – cujo papel já havia feito em filmes como ‘Flesh and the Devil’ (1926) e ‘The Torrent’ (1926). Oito meses depois, o estúdio MGM cedeu às demandas da atriz e, a partir desse momento, nasceu um novo tipo de personagem: a mulher sexualmente livre, complexa, emotiva e real 

Em seis de outubro de 1927, o primeiro filme sonoro é lançado: ‘O Cantor de Jazz’ (1927) – e a primeira frase falada do cinema, na voz de Al Jolson -, “You ain’t heard nothing yet” (Vocês ainda não escutaram nada) -, se tornou um ícone e um presságio para a nova fase e o consequente futuro do cinema americano. E foi no cinema falado que a mulher encontrou sua voz. 

imagem 2025 03 25 130013077

Porém, em outubro de 1929, o entusiasmo econômico e social deu lugar a uma das piores crises econômicas da história, com a quebra da bolsa de valores de Nova York. Nessa mesma época, mais de um terço dos cinemas americanos fecharam as portas; o público semanal passou de um milhão para 60 mil espectadores – e nem a maior indústria americana saiu ilesa do que ficou conhecido como A Grande Depressão. 

Com o começo do cinema falado, cujos filmes eram conhecidos na época como “talkies”, os estúdios tiveram total liberdade de criação, assumindo riscos que custariam anos mais tarde sua censura, com a criação do Código Hays.  Em filmes como ‘Anna Christie’ (1930), o primeiro longa falado de Garbo, encontramos a atriz, conhecida pelos papéis glamorosos de vamps, interpretando uma imigrante recém-chegada em Nova York, depois de trabalhar em um bordel por dois anos. A primeira fala de Garbo releva o tom do filme – levando em consideração que a Lei Seca ainda estava em vigor no Estado americano: “Give me a whiskey. Ginger ale on the side. And don’t be stingy, baby” (me dê um whiskey, acompanhado de um ginger ale. E não seja mesquinho, querido).

‘Anna Christie’ foi um sucesso de crítica e público, tornando Garbo uma estrela do cinema falado e garantindo-a, além disso, uma nomeação para o Oscar de melhor atriz em 1931. 

imagem 2025 03 25 125940359

No mesmo ano, a MGM também lançou o filme que rendeu o Oscar de melhor atriz para Norma Shearer‘A Divorciada’ (1930). Conhecida pelos papeis idealizados no cinema mudo, Shearer deu voz a personagens que desafiavam o status quo, e o mais importante, que não eram punidas ou julgadas por isso. 

Em ‘A Divorciada’, Shearer interpreta uma mulher cujo marido mantém relações fora do casamento. Caso dentro dos padrões cinematográficos de alguns anos antes, a personagem sofreria calada e, no final, o marido, em um ato nobre, voltaria para os braços de sua verdadeira amada. Porém, no longa em questão, Jerry (Shearer) responde à traição do marido com a mesma moeda. Nesse momento, a indústria cinematográfica percebe que o sexo, mesmo em uma situação de crise financeira, ainda era lucrativo. E pela primeira vez, as heroínas da silverscreen refletiam o espírito da jovem americana que rejeitava os tabus da Era Vitoriana e estava disposta a explorar o seu poder sexual. Apesar da preocupação do estúdio, o filme foi um sucesso, estabelecendo o domínio feminino entre os atores mais bem pagos de Hollywood. 

Shearer e Garbo não estavam sozinhas. Barbara Stanwyck, em ‘Serpente de Luxo’ (1933), também trouxe um novo retrato da juventude americana, que buscava independência, ao mesmo tempo que enfrentava as dificuldades da crise econômica. 

imagem 2025 03 25 125847818

O filme, analisado pelo grupo, conta a história de Lily, uma jovem que vive explorada pelo pai, dono de um speakeasy – bares onde as bebidas eram vendidas ilegalmente durante a Lei Seca – e que cuja morte a faz tentar a sorte em Nova York. Baseado na filosofia de Nietzsche, a personagem reprime os seus sentimentos para focar apenas no seu objetivo principal – tornar-se rica. Dessa forma, ela usa os homens, assim como os eles a tinham “usado” durante toda sua vida. É importante ressaltar que o simples fato de usar um filosofo como um traço marcante de Lily demonstra uma construção profunda da personagem, recurso que é negligenciado por consequência do Código.  

O filme está carregado de críticas sociais, revelando de forma bruta a situação do operário americano, que se via desamparado pelo governo durante os primeiros anos da crise. Nessa linha, o filme coloca em discussão a corrupção e o caos social gerado pela pobreza – tópicos que anos mais tarde seriam considerados subversivos. 

Nas primeiras cenas do longa, vemos o pai de Lily negociando com um político que protege o seu estabelecimento ilegal em troca de favores. O público é levado a concluir, pelo quadro seguinte, a verdadeira intenção do homem. Lily é deixada sozinha com o político corrupto e recusa os seus avanços, até que ele se torna violento e, como ponto de virada, ela o ataca com uma garrafa de vidro. A cena se encerra com o homem saindo do bar, ensanguentado. Agora, a mulher não só tinha liberdade e desejos sexuais, mas também o direito de escolher, como bem entender, seu parceiro ou sua parceira.

imagem 2025 03 25 125808708

Lily usa da suposta “fraqueza” masculina para ascender profissionalmente, sem nenhuma vergonha de explorar a sua sexualidade para alcançar os seus objetivos pessoais. Essa também era uma característica muito explorada durante esse período do cinema americano, além de outros aspectos de natureza dúbia, principalmente em relação ao caráter das personagens – resultando, assim, em criações tridimensionais. 

Ainda em 1929, Shearer causou um choque na estreia do filme ‘The Trial of Mary Dugan’. Aqui, a atriz interpreta uma dançarina da Broadway, cortejada por vários homens, acusada de homicídio. Mesmo assim, o filme espera que o público se identifique com a personagem, usando de recursos básicos da narrativa para que todos possam torcer pela vida de Mary (Shearer). Assim como outros filmes dessa era, ‘The Trial of Mary Dugan’ ousou desafiar a cultura americana, principalmente em relação ao papel social dos gêneros. Ao invés de refletir a moral pregada pela sociedade, esses filmes incitavam o público a repensar os valores sociais e políticos – e a moral pré-direcionada do que era considerado “bom” ou “ruim”. 

Segundo o livro Complicated Women: Sex and Power in Pre-Code Hollywood (2001), antes do Código, as mulheres tinham amantes, filhos antes do casamento, abandonavam os maridos infiéis, exploravam sua sexualidade e mantinham posições profissionais sem se desculparem pela sua independência, ou seja, agiam de um jeito que, segundo o imaginário coletivo de atualmente, só seria possível depois dos anos de 1960. 

A ERA DO CÓDIGO

imagem 2025 03 25 125742420

O cinema foi concebido, inicialmente, como um lugar escuro, onde a espionagem para com o outro era permitida e a pulsão do olhar encontrava um terreno propicio para manifestação. O “pecado” do voyeurismo está na base do próprio dispositivo técnico do cinema – máquinas, o “ver” através dos buracos da fechadura, ou seja, lugares onde se pode ver sem ser visto. Dessa forma, até hoje, o prazer do filme não pode ser dissociado do olhar como objeto de desejo.  

Os filmes que antecederem o Código tendiam a explorar justamente o prazer do olhar e usavam o corpo feminino como a forma mais óbvia e apelativa em uma sociedade ocidental em crise, regrada, de certa forma, pela ideologia cristã e pelas regras do patriarcado. A objetificação da mulher é, também, uma consequência de uma indústria formada em sua grande maioria por homens, em todos os níveis de produção e direção. Ou seja, os valores e atitudes reafirmados nos produtos da indústria cultual são dessa classe dominante, dona dos meios de comunicação. 

Em filmes como ‘Cavadoras de Ouro’ (1933), um musical pré-código dirigido por Mervyn LeRoy e pelo renomado coreógrafo Busby Berkeley, a mulher, apesar de assumir o papel de protagonista no longa, ainda é colocada, muitas vezes, literalmente, como um objeto de cena. Como na primeira sequência do musical, onde todas as mulheres enquadradas nos primeiros minutos aparecem vestidas como moedas, por vezes a fantasia esconde o rosto das dançarinas, que cantam a música “We’re in the Money”. A perda da individualidade e humanidade das showgirls recai, também, sobre a falta de diversidade entre as dançarinas, pois todas as mulheres em cena são fisicamente similares, ao mesmo tempo em que sua identidade está sendo consumida pela grandiosidade do cenário e do espetáculo.

imagem 2025 03 25 125721093

Segundo o linguista e filósofo Ferdinand de Saussere, o processo de criação de sentido não é neutro. Dessa forma, se levarmos o contexto econômico em consideração, o corpo feminino é relacionado diretamente ao “objeto” de desejo mais relevante durante os anos da recessão americana, o dinheiro. O próprio diretor, conhecido por projetar as mais belas coreografias do cinema, descrevia “suas garotas” (as dançarinas) como “perolas idênticas em um fio de nylon”.  A mulher, passiva e objetificada, funciona como um objeto de fetiche, enquanto o homem assume o seu papel de voyeur.   

Moralistas cristãos, especialmente católicos, sempre tiveram uma posição muito clara em relação a “indecência” em Hollywood. Em 1922, os estúdios se uniram para criar o MPPDA (Motion Picture Producers and Distributors of America) e indicar Hays para ser o presidente dessa organização, com o objetivo de limpar a indústria cinematográfica de todos os males. 

Com a popularização do cinema americano, Hollywood, se tornou a terra do pecado e do sucesso, atraindo artistas, investidores e, principalmente, escândalos. Preocupados com possíveis intervenções do Estado, os estúdios se uniram, novamente, em 1930, para criar o Motion Picture Production Code. O objetivo inicial, desse código, era evitar a censura, criando um guia para auxiliar os estúdios durante a produção audiovisual. 

imagem 2025 03 25 125657616

Porém, em 1934, Joseph Breen, um católico fervoroso, assumiu a presidência do MPPDA, e, no dia 1° de julho de 1934, instituiu o Código Hays. A partir de então, as peças audiovisuais só poderiam ser exibidas nas telas de cinemas americanas, ou até mesmo entrar em produção, depois de receberem o selo de aprovação do Código.  

O Motion Picture Production Code durou mais de 34 anos, até 1968, construindo, dessa forma, no imaginário coletivo, uma américa idealizada, a terra da liberdade, com príncipes de terno e gravata e princesas virginais. Esses filmes calcaram, durante anos, barreiras de gênero e raça, que ainda são visíveis na produção cinematográfica atual, e fizeram parte do consumo cultural, que formou os inúmeros profissionais, que hoje, atuam em importantes cargos da indústria do cinema em todo o mundo.

Sob as limitações do Código, a sétima arte entrava em um novo período. Os filmes não só estavam proibidos de exibir nudez ou qualquer linguagem obscena, a partir de agora, os estúdios deveriam seguir uma extensa lista de do’s and don’ts/be careful (faça e não faça/tenha cuidado). Dessa forma, mais uma vez, a mulher seria submetida a posições secundarias; o sexo antes do casamento, o adultério e o divórcio estão proibidos – e caso a personagem cometa qualquer um desses “pecados”, mesmo em nome do enredo, ela deve sofrer as consequências do seu ato.

NÃO FAÇA 

TENHA CUIDADO 

Escravidão branca  Violências, roubos e furtos 
Miscigenação (relações afetivas ou sexuais entre negros e brancos)  Simpatia com criminosos 
Nudez  Pessoas e instituições públicas 
Ofender, ridicularizar ou profanar crenças religiosas (mais especificamente as católicas, cristãs e protestantes)  Homem e mulher deitados na mesma cama e cenas de beijos excessivos 
Gestos e posturas vulgares  Estupro 
Tornar vícios atraentes (jogos de azar, bebidas alcoólicas e drogas ilícitas)  Crueldade com crianças e animais 
Referências a perversões sexuais e doenças sexualmente transmissíveis  Sedução deliberada 

 

Essa lista, apesar de diminuir o papel da mulher como objeto sexual, diminuía sua representação em geral, tornando-as, em todos os filmes, personagens rasas resumidas a “boas” ou “más”. 

Antes da instalação das regras, as mulheres podiam enganar os homens, os fazer de bobos, roubar, matar, trair e isso não significava que estas iriam se dar mal no fim, o que contrasta com os filmes feitos durante o código, onde as personagens “impuras” deveriam morrer, serem presas, ou algo do gênero. 

Os atores e principalmente as atrizes que alcançaram o sucesso durante os anos pré-Código, interpretando personagens complexos e misteriosos, de repente estavam enfrentando dificuldades com péssimos roteiros e com personagens fracos. Algumas estrelas de Hollywood conseguiram sobreviver a transição: Shearer e Stanwyck, por exemplo, mantiveram sua popularidade. Porém, algumas lendas do cinema americano, como Garbo, Marlene Dietrich e Mae West, começaram a perder público poucos anos após a aprovação do Código. Indefesa e frágil, a mulher do cinema, já não representava a mulher atuante na sociedade, que enfrentou os anos difíceis da Depressão e estavam prestes a encarrar a Segunda Guerra Mundial. 

imagem 2025 03 25 125613069

Mick LaSalle escreveu em ‘Complicated Women’ que o Código “[…] foi designado para colocar o gênio de volta na garrafa – e a mulher de volta na cozinha”. O papel da mulher, mais uma vez, estará restrito aos moldes do cinema mudo – a ingênua ou a vamp (que agora será chamada de femme fatale, reforçando o seu papel de vilã) voltam as telas de cinema do mundo todo. 

Em 1939, Dietrich, famosa pelos seus grandes papeis durante o cinema pré-Código, volta as telas depois de dois anos sem atuar, com o aclamado western, ‘Destry Rides Again’ (1939). O filme conta a história do jovem xerife Destry Jr. (James Stewart), que chega na pequena cidade de Bottleneck para acabar com o crime organizado. Dietrich interpreta Frenchy, uma cantora e dançarina do bar local, namorada e cúmplice do chefe da organização criminosa.  

imagem 2025 03 25 125624396

Frenchy, a nova femme fatale do cinema americano, é uma personagem provocativa – suas roupas são curtas e a maquiagem é carregada – uma perfeita atriz de cabaré, a personagem canta músicas provocativas e recebe atenção de todos os homens da cidade. Porém, qualquer semelhança com as mulheres independes do cinema que antecedeu o Código, acaba por aqui. Frenchy se apaixona por Destry, que não se entrega ao “pecado da carne” e, no final da trama, a dançarina morre em seus braços depois da batalha final entre o bem e o mal – com a vitória do jovem xerife, que se torna o herói da cidade. 

A cena final do filme ilustra o significado do Código para o papel feminino. Frenchy, para os padrões do Código Hays, é uma mulher “má”, pois a personagem não é casada, mantém um relacionamento com um bandido e vive em um ambiente hostil. De acordo com a censura, sua única saída é sofrer “a punição”, que nesse caso vem com a sua morte, no último ato do longa.

Mais notícias...

Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

Siga-nos!

2,000,000FãsCurtir
372,000SeguidoresSeguir
1,620,000SeguidoresSeguir
195,000SeguidoresSeguir
162,000InscritosInscrever

ÚLTIMAS NOTÍCIAS

MATÉRIAS

CRÍTICAS